Por uma fé engajada entre os jovens

















Não vemos mais aquele brilho nos olhos de nossa juventude, nem a consciência da realidade, vitalidade e luta que marcou toda uma geração na década de 80, por exemplo, a chamada “geração perdida”. Uma geração que foi às ruas, brigando por um Brasil mais justo e igualitário, por uma universidade melhor, mais aberta e inclusiva. E fico me perguntando, se aquela geração – que ainda tinha motivação para brigar por seus direitos e que acreditava em mudanças – pôde ser considerada “perdida”, o que se pode dizer desta, que, em geral, tem se demonstrado sem esperança, alienada, marcada pelo individualismo e o espírito de incerteza de nosso tempo?

Outra pergunta que podemos nos fazer é: até que ponto nossa juventude evangélica também não tem imergido nessa maré pós-moderna de hedonismo, consumismo, “lipoaspiração” e desconexão com a história? Será que não temos sido tão propagadores dessa “desplugação” geral quanto aos valores de comprometimento e solidariedade para com o outro, ao adotarmos indiscriminadamente a novas formas de religiosidade do eu que por aí se tem difundido? Parece-me que uma resposta contundente está nas palavras de Marcelo Gualberto:

Os jovens evangélicos de hoje nasceram e cresceram sob um tipo de ‘ditadura musical’ não institucional que praticamente excluiu da agenda e da liturgia a Palavra, estabelecendo infindáveis “períodos de louvor” – não raro, liderados por pessoas absolutamente despreparadas ou não vocacionadas. O microfone passou das mãos dos pregadores para as mãos dos músicos e cantores. Estes, por sua vez, incentivaram a juventude a mandar ‘beijinhos pra Jesus’, ‘orar de madrugada porque a fila é menor’, ‘sentar no colo do Pai e puxar sua barba’, ‘ter um romance com Deus’, ‘correr na casa do Pai’ e desenvolver uma espiritualidade utilitarista, pela qual o servo passa a ser o senhor que determina e “toma posse” da benção, que considera uma obrigação divina.

Gualberto ainda oferece algumas pistas sobre que jovem surgiu na igreja evangélica como fruto desse tipo de espiritualidade. Três características são apontadas:

1) Juventude religiosa no discurso, mas incrédula na prática. Nossas igrejas estão cheias de jovens cujo discurso não combina com a prática (isso quando tem discurso). É crescente o número de jovens, mas também é crescente o número dos que engrossam a fila dos “sem-religião”.

2) Juventude conectada, mas imatura. É uma juventude conectada com as transformações no famigerado mundo gospel, porém imatura espiritualmente por falta de interesse no estudo sistemático da Palavra. É bem-informada, mas com uma pobre formação teológica.

3) Juventude sarada e talentosa, mas cansada e indisponível. Embora faça parte dessa geração saúde, fitness, que adora corpos bem-cuidados, está cansada por inúmeros compromissos, e por isso mais propensa à busca por um evangelho Light, e a viver apenas o cosmético da fé.

É difícil,
mas temos de confessar e lamentar que nossos sonhos como igreja hoje não ultrapassam mais os devaneios de consumo da sociedade pós-industrial e selvaticamente capitalista em que vivemos. Que nossos anseios por mudança não passem mais por propostas fecundas de reforma social e política, através do engajamento nas estruturas sócio-políticas e nos movimentos de base. Que a razão de ser de nossa criatividade e mente cristãs seja a de gerar e gerir estratégias de acomodação dos crentes e de crescimento da igreja (Robinson Cavalcanti diria “inchação”). Que nosso estilo de vida, que supostamente deveria ser semelhante ao do Mestre, seja tão fechado em si mesmo, restringindo-se ao medíocre “triângulo da felicidade”: casa-igreja-trabalho.

Bases bíblico-teológicas para o engajamento e a ação profética

“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresentei o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”. (Rm 12.1-2)

São Gregório, o Grande, já diria: “É melhor arriscar-se a provocar um escândalo do que calar a verdade”. Hoje, temos feito o inverso: calado a verdade para que o escândalo seja o menor possível, e o esvaziamento de nossas igrejas seja uma possibilidade remota. Endossamos definitivamente a religião do self. É um evangelho às avessas. Importa que o(a) crente saia da igreja feliz, de bem com a vida, satisfeito e quase que flutuando em “espiritualidade”, mesmo que isso não produza uma base sólida para que ele(a) possa enfrentar os dilemas e adversidades do dia-a-dia com o discernimento e a lucidez do Espírito. Não. O que acontece é que os problemas se acumulam e permanecem lá, na família, no trabalho, na vida cotidiana, e será preciso mais uma dose de culto, de louvor, de êxtase na veia do crente pra que ele possa suportar as pressões externas contra as quais não tem sido educado na igreja a resistir com a força e sabedoria do alto, mas com a droga dos “cultões” e “louvorzões”, da qual tanto prezamos e dependemos.

É uma igreja que perdeu o foco da missão e transformação do ser humano todo por meio da vivência e proclamação do evangelho em sua integralidade. Os cristãos reunidos em Lausanne fizeram a seguinte confidência: Confessamos, envergonhados, que muitas vezes negamos o nosso chamado e falhamos em nossa missão, em razão de nos termos conformado ao mundo ou por nos termos isolado demasiadamente. Qual é o impacto e atualidade dessa afirmação para a igreja evangélica hoje? Será que temos sido menos conformados com este século que nossos irmãos admitiram estar sendo em 74? O que, afinal, caracteriza essa conformação com o mundo?

Agir em conformidade com o mundo é assumir a sua forma. Uma igreja que se conforma é aquela que absorve ou é absorvida pelo estilo de vida preconizado pelo mundo e pelos seus sistemas. É aquela que se curva aos seus ditames, cooperando para a propagação dos imperativos que têm impregnado as mentes de homens e mulheres no século XXI, tais como o consumismo e o individualismo. Conformismo, segundo Cavalcanti, “é um ajuste às estruturas existentes de forma acrítica, passiva, preguiçosa, abúlica”. Por outro lado, poderíamos falar de uma igreja que rejeite esse ajuste, por se afastar demasiadamente dos “valores mundanos”. Mas não deixa de ser conformada, à medida que se compromete mais com a manutenção de suas estruturas e, conseqüentemente, não abre espaço para a solidariedade, alteridade e transformação tanto no pensar como no agir.

Uma igreja conformada é, no linguajar de Robinson Cavalcanti, uma comunidade do reino que “perdeu o reino”. A igreja é o “novo Israel” que substitui o velho Israel. Falhará a igreja em antecipar os sinais do reino que já veio a partir de Cristo? Terá razão um certo pensador quando diz que o reino poderá vir “por meio da igreja, sem ela ou, até, contra ela?”. Só Deus sabe.

O fato é que, em sua Palavra, ele nos insta a que sejamos inconformados com o presente século. Quem são as pessoas inconformadas? De acordo com Cavalcanti, “inconformados são aqueles que se recusam a tomar a forma, que emburram diante das formas, sua forma é outra; elas são inconformadas, negam-se a tomar a forma”. Um dos desafios de uma igreja engajada e militante é o inconformismo. É também uma das maneiras de atestação de que o reino “já” veio, como outra vez diz Cavalcanti:

O reino é ainda atestado pela nossa inconformação, nossa rejeição e atitude crítica em relação ao estado de coisas contrário ao modelo de Deus: o anti-reino das trevas e nossa transformação, de nós próprios e de nossos relacionamentos, pela renovação de nossa mente, que sintoniza a mente de Cristo e agora consegue ver além da mera letra.

Continua...

Escrito por Jonathan Menezes com título original "Missão integral, desafios a uma fé engajada na igreja" (Via Emeurgência)

Nosso making of existencial!

 Por Hermes C. Fernandes

Às vezes penso que ao adentrarmos a eternidade, teremos acesso aos nossos arquivos existenciais. Poderemos até assistir in loco a cada episódio de nossa jornada, porém, sem poder interferir em nada. Acho que há lições preciosas que nos foram ministradas durantes tais episódios, que não foram apreendidas completamente. Teremos que fazer uma espécie de revisão. Talvez tenhamos aprendido apenas o superficial, conquanto haja camadas mais profundas que careçam de ser investigadas. 

Também acredito que aferiremos o alcance e a repercussão que nossas obras tiveram, bem como tomaremos conhecimento de vidas que foram afetadas direta ou indiretamente por elas. Não ouso dogmatizar sobre isso. Trata-se apenas daquilo que chamo de “ficção teológica”.

Porém, há passagens bíblicas que parecem indicar tal possibilidade. Apocalipse diz que bem-aventurados são os que agora dormem no Senhor, pois suas obras os acompanharão. Portanto, em nossa viagem rumo à glória final, carregamos uma bagagem existencial. A cada escala desta viagem, acrescentamos novos ítens à nossa bagagem. Quando lá chegarmos, abriremos a mala e verificaremos ítem por ítem. Roupas amarrotadas terão que ser passadas e colocadas no cabide. O que estiver no fundo da mala, e que já até houvermos esquecido, será trago à tona, porém, já não nos trará qualquer tristeza, porque nos será revelado o propósito por trás dos fatos.

Comparando a um filme: a hora de partirmos deste mundo, será o momento em que a fita será rebobinada. Na glória poderemos assisti-la, sem cortes, sem censura, sem edições posteriores, versão do supremo Diretor. Assistiremos, por assim dizer, ao making of de nossa vida terrena. Descobriremos, entre outras coisas, quantas vezes recebemos livramentos, sem que houvéssemos dado conta deles. Saberemos, finalmente, onde, quando e como todas as coisas cooperaram em conjunto para o nosso bem, e para a glória d’Aquele que nos amou.

Assim como atualmente, muitos filmes estão sendo relançados numa versão 3D, veremos nossa vida numa versão amplificada, envolvendo todas as dimensões da existência, bem como suas interações e implicações.

Não creio que nos esqueceremos dos fatos em si, mas das dores que eles provocaram. Deus não precisa queimar arquivos, simplesmente, porque hão há o que esconder. Tudo, finalmente, fará sentido.

Você já sentiu saudade do Futuro?

“Também temos saudade do que não existiu, e dói bastante” (Carlos Drummond de Andrade).

“Saudade”. Sem dúvida uma das mais belas palavras de nossa língua. Uma das únicas que não podem ser traduzidas pra nenhum outro idioma.

Embora só exista o vocábulo “saudade” em português, este sentimento é comum a todos os povos e culturas. Temos saudade do que passou, de pessoas que se foram, de experiências que vivemos, e até daquilo que fomos um dia.

Mas a pior das saudades é a saudade do futuro.
Como é possível sentir saudade do que ainda não vivemos? Que sentimento é esse?

Imaginemos uma mulher grávida, que subitamente aborta o filho. Mesmo sem nunca tê-lo embalado em seu colo, nem tê-lo visto, o que ela sente é saudade. Não é saudade da barriga preponderante, mas de um futuro que jamais se concretizará. Saudade de toda expectativa investida. Saudade de um choro de criança que ela jamais ouvirá.

É uma sensação estranha, porém, real. Cada momento que vivemos está grávido do futuro.
O futuro é fruto do casamento entre a eternidade e o agora.

Às vezes temos a sensação de que o futuro foi abortado. É esta sensação que produz em nós um tipo de saudade do futuro.

O sábio Salomão diz que Deus “pôs a eternidade no coração dos homens” (Ec.3:11). Em outras palavras, Deus fecundou nossa alma com a semente da eternidade.

Nosso corpo está sujeito ao tempo, mas nossa alma nos conecta diretamente à eternidade. E é por isso que Paulo declarou: “Por isso não desfalecemos. Ainda que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em dia” (2 Co.4:16).

Se a fé nos conecta à eternidade, a esperança nos conecta ao futuro.

Há situações que enfrentamos em nosso dia a dia que parecem destruir nossa esperança. Aos poucos, a esperança vai cedendo lugar ao desespero. E quando isso acontece, não é apenas o corpo que se consome, mas também o homem interior.

Jó experimentou isso na pele e na alma:

“O meu espírito vai-se consumindo, os meus dias vão-se apagando, e só tenho perante mim a sepultura”. Jó 17:1

Isso me lembra uma cena do filme “De volta para o futuro”, em que o protagonista volta ao passado, e percebe que uma foto que ele trouxera do futuro está se apagando, pelo fato de seu passado estar sendo alterado, e seu futuro comprometido.

Não há como retornar ao passado para alterar o presente ou o futuro. Mas podemos viver o presente comprometidos com o futuro.

Quando vivemos sem qualquer perspectiva, nosso espírito vai se consumindo, quando a vontade de Deus é que ele se renove dia após dia. É nosso homem exterior que se corrompe com o tempo. Nosso espírito tem que ser constantemente renovado. A esperança é a fonte da juventude, onde nosso espírito deve mergulhar para manter-se sempre jovem e disposto.

Se nosso espírito for consumido pela falta de perspectiva, nossos dias desbotarão, e a vida perderá sua cor. Então, só nos restará uma possibilidade: a sepultura.

Nossos dias se apagam, quando nosso futuro se desvanece. Quando já não temos expectativas, nem esperança.

Era assim que Jó se sentia.

“Os meus dias passaram, malograram-se os meus propósitos, e as aspirações do meu coração (...). Se a única casa pela qual espero for a sepultura, se nas trevas estender a minha cama, se à corrupção clamar: Tu és meu pai; e aos vermes: Vós sois minha mãe e minha irmã, onde estará então a minha esperança? Sim, a minha esperança, quem a poderá ver?” Jó 17:11,13-15

Lembremo-nos que a fé que nos conecta à eternidade. Mas é a esperança que nos impulsiona para o futuro. Quando a esperança se esvai, temos que recorrer à fé.

Paulo diz que não devemos atentar “nas coisas que se vêem, mas nas que não se vêem. Pois as que se vêem são temporais, e as que não se vêem são eternas (...). Andamos por fé, e não por vista” (2 Co. 4:18; 5:7).

O futuro não pode ser abortado, mas a esperança sim. E se ela tem sido sabotada pelas circunstâncias adversas, somente a fé poderá restaurá-la.

Foi o que aconteceu a Abraão, que “em esperança, creu contra a esperança, que seria feito pai de muitas nações (...). E não enfraqueceu na fé, nem atentou para o seu próprio corpo amortecido” (Rm.4:18a,19a).

Soa estranho para nós alguém crer contra a esperança. Mas o fato é que a fé deve ter primazia sobre a esperança. Ela nos faz acessar a eternidade, onde o futuro já é presente, um presente que ainda não foi desembrulhado.

Na definição do autor sagrado, “a fé é a certeza das coisas que se esperam, e a prova das coisas que não se vêem” (Hb.11:1).

Nossa fé deve estar voltada para Aquele que “chama a existência as coisas que não são, como se já fossem” (Rm.4:17).

O que ainda será na perspectiva do tempo, já o é na eternidade.

Crer contra a esperança, é, ao mesmo tempo, crer aliado à esperança. É transcender o tempo e o espaço, e vislumbrar a eternidade.
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SOZINHOS, VAMOS MAIS RÁPIDOS. JUNTOS, VAMOS MAIS LONGE.